sexta-feira, 13 de julho de 2007

Bode Japonês


Nunca fui muito chegado a comida japonesa. Mas, temendo a exclusão do convívio social que seguiria a divulgação de tal heresia, nunca tornei pública esta aversão. Em vez disso, para escapar de convites para "japas"- apelidinho que, não gostando e não tendo intimidade com esses restaurantes, nunca me senti à vontade para usar -, eu apelava para o bode.

O bode nunca foi bem visto. Chifrudo e barbudo, sua cara de poucos amigos sempre o fez ser associado ao mal humor - quem está de bode não está a fim de falar com ninguém. Comendo tudo o que vê e cagando em igual quantidade, também originou a expressão "tirar o bode da sala" - você cria um problema (coloca o bode na sala) e, depois de resolvê-lo, percebe que as coisas não eram tão ruins quanto se imaginava. Nem sempre é assim. A minha história com a cozinha japonesa mostra que, algumas vezes, nem é preciso tirar o bode.

Amigos me chamavam para restaurantes japoneses, e eu, para não ser o tosco que não sabe apreciar essas maravilhas, apelava para o caprino: "não é que eu não gostasse, é que eu estou de bode". Estar de bode de comida japonesa é muito mais perdoável do que não gostar, porque estar de bode subentende que você comeu demais e enjoou - já fiquei com bode, por exemplo, de pudim de maria-mole, minha sobremesa favorita. Portanto, mais do que esconder o fato de eu não ser chegado à família do shushi, o bode dava a entender que eu gostava muitíssimo, tanto que comí quase ao ponto de uma congestão. Com a ajuda do bode, me livrei de vários almoços e jantares regados a saquê (que, por sinal, eu até curto) e à pretensa sofisticação que, não sei por que, sempre foi associada a essa cozinha - samurais e ninjas deviam mandar ver no sashimi após cortar as cabeças dos seus inimigos, e duvido que eles lavassem as mãos entre uma coisa e outra.

Ontem, depois de uma folha de honrosos serviços prestados, resolvi aposentar o bode. Diante do simpático convite da Carol para uma noite de sushi com amigos, não tive coragem de apelar para o marido da cabra. Fui lá e bravamente comi. E, sendo a mesa composta por quatro mulheres e apenas dois homens, comi pra cacete - que eu não sou de deixar comida no prato. Entre arrotos de bolinhos de arroz enrolados com alga, decidi: na próxima vez, simplesmente direi que não gosto da comida nipônica. Mesmo que isso me force ao exílio nas florestas, entre ursos, javalis e ogros.

2 comentários:

ju leal disse...

Le, meu cabeça, após 22 anos faço duas decobertas sobre você. Primeira: não é a favorita, mas é das mais, o tal do pudim de maia mole não deixa nada, eu disse nada, a desejar. Segunda: de fato a comida japonesa é horrenda, eu não sei qual é o glamour de frequentar um "japonês" (nome que eu escuto com mais frequencia e que eu sempre achei que era o nome de um lugar especifico, me sentindo sempre a out da história.
Quem diria temos mais coisas em comum do que os genes Leal, né?
E um salve para os bacons, lanches de pernil do estádio, torresmo e tudo o que faça entupir com maior rapidez as artérias coronarianas.
besos.

Leandro Leal disse...

Pois é, Juba. O gosto pelo pudim de maria-mole e o desgosto pela comida japonês devem ser genéticos (mas devem ser o tipo de característica que só se manisfeta de modo recessivo, já que o meu irmão adora "japa"). A pré-disposição a doenças cardiácas também é coisa dos genes, o que faz todo o sentido: gostando de comer porcaria do jeito que gostamos...