quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Tito e Peter Parker (ou o Direito de ter uma opinião diferente)

Peter Parker ouvindo o conselho do tio: a ficha só caiu depois.

O Tito é jovem. Como todo jovem deveria ser, é idealista. Acha que pode mudar o mundo. Ou, pelo menos, o voto dos seus amigos – como hoje chamamos centenas de pessoas que mal (e muita vezes nem) conhecemos, mas cujas fotos, palavras e intimidades aparecem nas nossas telas por força das redes sociais. O Tito, esse sonhador, quer um país mais justo, mais igual. Por acreditar que o atual governo tem feito um bom trabalho nesse sentido, ele “faz campanha” pela reeleição da presidente Dilma, divulgando vídeos e textos dos avanços alcançados pela sua administração. Tenta, também, manter um diálogo educado e razoável com todos os “amigos” que comentam seus posts, a maioria o recriminando por sua escolha eleitoral. Nem sempre consegue – sabe como é, o Tito mora em São Paulo, e por estas bandas você recebe melhor tratamento se assumir publicamente ser pedófilo.

Eu, como um entre as centenas de “amigos” do Tito, acompanho essa troca de mensagens públicas – ao evoluir para discussões, ele tem o bom senso de avisar os interlocutores que prefere transferi-las para o campo inbox. Mas, como um amigo sem aspas do Tito, me preocupo com a hostilidade de que ele tem sido alvo e, portanto, tento dissuadi-lo do debate nas redes sociais. Como já tinha feito antes – quando ele se posicionou de modo favorável aos “rolezinhos” e chegou a ser ameaçado –, o aconselhei a, sempre que quiser expor suas ideias sobre assuntos polêmicos, chamar amigos a uma mesa de bar. Entre pessoas que se respeitam e respeitam opiniões diferentes das suas, as chances de receber uma ameaça de morte são nulas. Já nas redes, que se têm mostrado (com o perdão do trocadilho) bastante antissociais, as chances de perder “amizades” são grandes – e graças à crescente dificuldade de se interpretar sutilezas e ironias, até mesmo amizades sem aspas. Terminei minha última mensagem ao meu primo (sim, esse rapaz é meu primo, o considero um irmão mais novo) dizendo a ele que, embora também tivesse minhas convicções, preferia dividi-las no off-line, pelos motivos que já disse, e reforcei minha preocupação com ele. Do outro lado, resposta nenhuma. Um silêncio que me fez refletir.

O ódio que pauta a troca de opiniões na atual eleição, evidentemente, não é privilégio exclusivo do meu primo. É um assunto comum em qualquer roda de conversa – on e off-line – e, por isso mesmo, faz muitas pessoas nascidas em tempos pré-internet (meu caso) afastarem-se do debate na redes. Afinal, não sou pago para defender ninguém e, portanto, nada ganho se for ofendido e (ou) ameaçado, penso eu. Ou, melhor, pensava. Refletindo sobre isso, me dei conta do quão velha é esta posição. As redes amplificaram enormemente o poder individual de difundir informação/opinião, e isso não pode ser ignorado. Fazê-lo seria o mesmo que fez o jovem Peter Parker, já picado pela aranha radiativa, ao deixar passar o criminoso que viria a assassinar seu tio. Mas, como lembrou esse mesmo senhor ao sobrinho antes disso: “com grandes poderes vêm grandes responsabilidades”. Antes de sair escrevendo ou repassando qualquer coisa, melhor ponderar bem, verificar a procedência e a veracidade da informação – afinal, se nos tornamos todos veículos, devemos adotar a mesma responsabilidade que exigimos dos tradicionais. Dito isso, concluo que não há problema em expressar um ponto de vista. Desde que seja de forma educada, com o tom adequado, com o respeito que jornais e revistas devem ter aos seus leitores – que, no caso da rede, são todos os “amigos” que recebem nossas atualizações. Você tem, claro, o direito de se isentar – como até agora eu fiz – mas, optando por isso, você também abre mão daquele outro direito. O que me deixa feliz é ver que, além do Tito, há outras pessoas ponderadas (mais velhas do que ele e até mais velhas do que eu) expressando seu voto. Em alguns casos, o voto é outro, mas a sensatez é a mesma que pretendo ter imprimido a este texto – que dificilmente será lido por inteiro, eu sei.

Voto na Dilma, como vota o meu primo. Se quiser comentar, por favor, use de educação.  E, por favor, não leve para o lado pessoal. Continuo não recebendo nenhum dinheiro para ser ofendido e (ou) ameaçado.


PS: Não sou pedófilo, amigos.