quarta-feira, 19 de junho de 2013

Cansou?

 
No começo da tarde, a academia que freqüento estava praticamente vazia. Os poucos que lá estavam corriam nas esteiras e erguiam seu pesos sem emitir maiores sons, além dos habituais grunhidos de esforço. Livre do falatório de sempre, eu quase não lamentava estar sem meu iPod. Mesmo o som ambiente – dance da pior qualidade, trilha comum em ambientes do gênero –, ao qual já me acostumei, não incomodava tanto. Mas a minha paz duraria pouco mais que o intervalo entre uma série e outra.
O silêncio foi preenchido pelo discurso indignado feito com abundância de decibéis por uma mulher que, caminhando em uma esteira, acompanhava o noticiário sobre as manifestações na TV (no mute, mas com as legendas do Closed Captions). Sua voz não se levantava em apoio aos protestos: ela (quase) gritava pelo fim deles. “Já encheu o saco. Já deu. Chega. Acho válido e tudo o mais, mas deixou de ser positivo e começou a prejudicar. E quem precisa trabalhar, como é que faz?” Essas e outras palavras, ditas em tom raivoso, ecoando por entre aparelhos de musculação e espelhos, aumentavam muito o peso dos meus halteres. “Cala a boca, cala a boca, cala a boca”, eu repetia baixinho e inutilmente.
Cinquentona em forma, de cabelos loiros tingidos e botox, ela era o estereótipo feminino  da classe média paulistana, inclusive no texto. Quer dizer, no texto que se esperaria de uma pessoa como ela até antes das manifestações se tornarem a coqueluche do momento. Ela mesma deve ter se declarado a favor do levante, em rodas de conversas com as amigas. Talvez até tenha colocado uma bandeira branca na janela do seu caro apartamento, ainda mais valorizado pela especulação imobiliária. Afinal, pegava bem. Mas cansou, né, gente?
Como essa senhora, muitos simpatizantes de ocasião já devem estar começando a retomar sua posição política habitual. Os que ainda não estiverem, não demora muito, voltarão a se interessar apenas pelos próprios umbigos – que já ficaram congestionados tempo demais por esses protestos. E assim, as aglutinações ficarão cada vez mais ralas, os coros, cada vez mais baixos. Até que ninguém mais se concentre, ninguém mais grite. (A não ser a meia dúzia de chatos de sempre, os que costumam se reunir na frente do MASP e atrapalhar o trânsito na Paulista aos sábados.)
A violência da minoria – como hoje a imprensa, já escaldada, faz questão de frisar – também é outro fator que contribui para afastar os protestantes de última hora. Pode até ser que os imbecis que tentaram invadir a prefeitura de São Paulo e os que destruíram o patrimônio público em outras capitais não representem o movimento, pode ser que tenham sido mesmo infiltrados com razões escusas. Mas talvez o estrago já esteja feito, para além do que esses marginais depredaram. Suas ações podem ter dado a desculpa que muitos precisavam para não se unir à multidão. Hoje, ninguém está disposto a dar a vida por uma causa – ainda mais uma tão vaga quanto esta –, nem ao menos a levar uma bala, de borracha que seja. Depois dos excessos da semana passada, ontem a PM pegou leve (estranho dizer isso) e foi por isso acusada de omissão. Vai querer responder a essas acusações. Despreparada como é, imagine como vai ser essa resposta.
Tomara que eu esteja errado, que o modismo das manifestações não esteja, por um motivo ou outro, passando. Gostaria muito que elas continuassem a incomodar as autoridades. E, principalmente, aquela coroa mala da academia.  

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