Ontem, recebi uma mensagem do Alex, daquelas que
você consegue ler com a voz de quem escreveu. “Não sou do tipo que faz isso,
mas só tenho a agradecer por você ter me mostrado mais Smiths. Faz parte da
minha vida hoje em dia.” O pseudo mal
humorado desenhista que no fundo é bonzinho se referia ao tempo em que, ainda publicitário, trabalhamos
juntos e, além de quadrinhos e opiniões sobre os desenhos um do outro (mesmo
sem o talento do camarada, também dou minhas nanquinzadas), trocamos músicas.
Pelo iChat, o Alex me mandava coisas do Frank Zappa e do Hal And Oats. Eu
retribuía com as menos óbvias dos Smiths – e também com as óbvias, acrescidas
do comentário “escuta com atenção”.
Feliz por ter, de certa forma, melhorado a vida
do amigo, respondi a mensagem. Só para descobrir, depois de algumas outras, que
ela tinha sido irônica – ainda que involuntariamente. Alex se define como
desenhista, mas, faz um tempo, seu trabalho extrapola esse ofício. Entre tantas
coisas, já fez vitrine de loja, toy art e diversos murais: sempre acompanhados
de passarinhos que piam corações, seus velhos, santas e hipsters são comumente
vistos nas ruas de São Paulo e até mesmo nas paredes de algumas casas. A história
que me contou se passou justamente quando fazia uma dessas pinturas, “num
predinho de quatro andares.” Pintava sem dar muita atenção à música que vinha
dos fones de ouvido, mas só até essa música ser “This Charming Man”. Aí, passou a pintar com mais ânimo e,
por que não?, a dançar. Empolgado, pisou em falso e só não se estatelou na calçada
porque outro andaime, abaixo de onde ele estava, impediu.
Quer dizer, as tais músicas que salvaram a vida
de tantos – a minha, inclusive – quase abreviaram a do Alex. E ele, veja você,
me agradeceu por isso. Mas, se pensar bem, dá para entender. Cair de um andaime
num prédio de quatro andares pode não ser tão poético quanto ser atropelado por
um ônibus de dois, mas tem o seu valor. (O das obras dele, aliás, aumentaria
bastante – sorte de quem já comprou uma, azar dele, que não poderia tirar
proveito disso.)
Por esses dias, o Alex está indo para Londres,
passar uns dias. Por lá, talvez pegue alguns ônibus de dois andares, mas vai
perder os mais importantes: aqueles cantados por Morrissey, cujos shows no
Brasil acontecem exatamente enquanto o Alex estiver na terra dele. Depois de
quase terem sido adiadas por conta de uma ameaça de morte essa sim nada lírica –
intoxicação alimentar causada por um penne ao sugo (já foram feitas tantas
piadas com isso, que vou deixar passar) –, as datas do ex-líder dos Smiths foram confirmadas.
Um comentário:
"and if a ten ton truck
kills the both of us
to die by your side
well the pleasure and the privilege is mine"
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