terça-feira, 3 de janeiro de 2017

O que eu aprendi com a São Silvestre

Sempre corro de fone. Sempre. Então, fiz uma playlist para ouvir durante a São Silvestre, que mandei para um grupo de WhatsApp com amigos também prestes a correr a prova. Só rock fácil, divertido e, às vezes, motivacional -- para aqueles momentos em que você precisa ouvir um "vai, tigre!", mas não quer ouvir isso de fato.
O Paulo logo respondeu dizendo que não ouviria, pois preferia a voz do povo (nada a ver com a de Deus). A Rita disse que ia na do Paulo. Ok. Lá fui eu para a minha primeira São Silvestre, a corrida de rua mais famosa e emblemática do calendário de provas do Brasil.
Chegando à Paulista, vi o lugar previsivelmente abarrotado, repleto das esperadas figuras. Gente fantasiada de super-heróis, de personagens do Star Wars e até do Bozo. Pus meus fones e, depois da também esperada demora da largada, comecei a correr, naquele ritmo de festa, sem pretensão nenhuma além de chegar ao fim da corrida. (Tendo bebido como o fiz nos últimos dias, nem poderia querer outra coisa.) Mas, logo que entrei pelo túnel da Paulista com a Dr. Arnaldo, ouvi um grito coletivo, uma manifestação mista dos corredores e do público, como nunca tinha ouvido. Lembrei do Paulo e da Rita e decidi seguir seu exemplo. A partir daí, a corrida virou uma experiência inteiramente diferente.
A São Silvestre, aliás, é uma outro tipo de corrida. Dela, não participam apenas os "chatos da corrida" -- categoria na qual, apesar de não gostar, me encaixo. Vem todo tipo de gente, de todos os lugares do Brasil, levados com orgulho em faixas, camisetas e gritos. É uma prova em que há um acordo tácito: "sempre que aparecer uma câmera (especialmente de TV), eu vou fazer de tudo para aparecer e, se não gostar, problema seu". Eu, em geral tão chato, entendi de pronto essa dinâmica e nem me incomodei com gente pulando na minha frente a cada possibilidade de registro. Assim como não me preocupei ao constatar que o meu ritmo médio estava (como se confirmaria) o pior de todas as provas de que já participei. Aquilo, para mim, era um treino longo e relaxado, o último de 2016, uma aula de antropologia e, mais que tudo, uma lição de convivência.
Tanto que, a corrida já encerrada, nas calçadas da Paulista tentando ir ao bar onde tinha combinado de encontrar os amigos, aceitei numa boa a impossibilidade de avançar a mais de 200 metros por hora. Estava mais preocupado em olhar ao redor, ver as pessoas e suas reações. Aproveitar o lindo dia de sol, que, passada a prova, já não me massacrava da mesma forma. Sabia que, em breve, me sentaria à mesa com um chope a frente, trocando experiências com os amigos corredores. E assim foi.
Minha primeira São Silvestre me ensinou, mais do que tudo, a conviver. (O dia a dia sempre ensina, mas a corrida serviu de professora de reforço.) Quero levar para 2017 o que aprendi hoje. Escutar, enxergar e tentar entender o outro. Afinal, como a São Silvestre, a vida é coletiva e atrapalhada, e, sem certo esforço, ninguém chega bem ao fim de ambas.


Outra coisa que aprendi foi: bigode, por que não?

(Texto escrito no dia 31 de dezembro)


Um comentário:

Evellyn disse...

"Afinal, como a São Silvestre, a vida é coletiva e atrapalhada, e, sem certo esforço, ninguém chega bem ao fim de ambas." ������ Adoro o jeito como você escreve :)