sexta-feira, 29 de maio de 2015

Fodam-se os carros


Estava eu ontem, voltando para casa no trânsito paulistano, que ignora horários e insiste em ser complicado mais de duas horas depois da hora do rush – por aqui, são todas as 24. Numa das estreitas ruas da Vila Olímpia, um acesso à Avenida JK, eu tentava encaixar o meu entre os outros carros, esperando o que estava à frente evoluir para entrar em seguida. Nisso, vejo a motorista do carro atrás daquele de cara feia, praguejando algo que o vidro levantado não me permitia ouvir. Baixei e ela gritou que "é um de cada vez, não tá vendo?" Nem respondi. Ela passou e, no caminho, deu uma raspadinha no meu carro. Então eu disse, alto, mas não de raiva, só para ela ouvir: "Quem não tá vendo parece que é você". Ergueu o vidro e continuou seu caminho, cheia de razão.

Metros depois, já estava virando na avenida quando o motorista do carro ao lado do meu, também virando, não me viu. Resultado: uma batida bem mais séria que a de minutos antes. Depois de dar um grito impróprio, baixei o vidro e vi que o outro saía do seu carro. De terno e gravata e cabelo branco, tratava-se de um executivo e seu carro era bem mais caro que o meu. “Como você quer fazer?”, perguntei. “Vamos chamar a polícia”, respondeu.

Enquanto ele ligava, olhei meu carro, com o para-choque quebrado, e o dele, com a lateral arranhada. Propus: "Vamos fazer assim? Você cuida do seu, eu do meu... Afinal os dois somos igualmente culpados", completei, já imaginando que ele rejeitaria a sugestão. Mas não. "Quer saber? Nessas horas, o importante é que ninguém se machucou. Fodam-se os carros", disse ele simpático, num sotaque que denunciava sua origem estrangeira. Apertamos as mãos e cada um foi para o seu lado. Fiquei pensando: “Ótima oportunidade para criticar os brasileiros (a mulher) e elogiar os estrangeiros, não?” Não.

Sou brasileiro, cacete. Se eu não fosse civilizado, jamais descobriria que o gringo também era. Imbecilidade não é questão de nacionalidade, apesar de inúmeros compatriotas – entre eles, os que adotam o discurso “os americanos não muito melhores” – fazerem questão de demonstrar o contrário.


Para minha amiga nervosinha, apenas um conselho: dirija com mais calma, com mais atenção ao que importa. Fodam-se os carros.


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