Nunca fui muito bom
com dedicatórias. É estranho dizer isso, uma vez que textos curtos e
inteligentes e engraçadinhos fazem parte das minhas atribuições profissionais
como redator publicitário, mas o fato é que dedicatórias nunca foram meu forte.
Talvez exatamente por eu encará-las assim, como a oportunidade de exibir minha
inteligência e meu senso de humor – esses, que as pessoas esperam que eu, como
um sujeito que trabalha com criação, tenha –, quando, na verdade, dedicatórias talvez
devessem ser muito mais simples. O texto que a gente escreve a mão, na folha
que abre o livro, não pode querer competir com o conteúdo que precede – de
outra categoria, inferior, corre enorme risco de nocaute logo nos primeiros
segundos. Melhor é, portanto, apostar na singeleza, na despretensão de um
“espero que você goste deste livro” ou algo do gênero. É, pode até ser, mas
para mim nunca funcionou muito bem. Quando optei por essa tática, fracassei.
Não um fracasso patente, perceptível pelas pessoas para quem eu escrevi as breves
palavras, mas meu sentimento foi de ter perdido, se não por nocaute, por
pontos. “Por que não pensei um pouco mais antes para escrever? Toda vez que a
pessoa abrir a porra do livro, vai ver essas bobagens que qualquer um poderia
ter escrito.” Dedicatórias sempre foram um fardo muito grande para mim, uma
parte ínfima do cotidiano – mesmo que sempre presenteie livros, não é algo que
faça todo os dias – com um peso muito maior do que sua frequência. Ainda hoje,
sou assustado pelo fantasma de palavras idiotas escritas em livros que dei há mais
de 10 anos.
Este ano, porém, tudo
mudou. Não que tenha me tornado, de repente, um grande escritor de dedicatórias.
É que me tornei um escritor, e nem foi de repente. Sempre escrevi, como tantos,
para consumo próprio e de poucos. Mas só me arrisquei a me intitular assim quando
o alcance da minha produção passou a ser um pouco maior, quando alguém ousou
publicá-la em livro, e isso só aconteceu em 2014. Foi aí que, como se antes já
não fossem opressoras, aquelas pequenas palavras azuis de esferográfica
adquiriram um tamanho mais que garrafal no meu cotidiano. Se já esperavam
palavras brilhantes de um
publicitário, qual seria a expectativa com relação a um escritor? Que tática
adotar agora? A singeleza das palavras despretensiosas, como quem diz “meu
melhor texto vem a seguir” (o que, aliás, só pode ser subentendido, jamais
escrito)? Ou a arrogância de quem acha que sempre pode se superar, como num
Street Fighter em que você, tendo escolhido o Ryu, enfrenta a si mesmo, de quimono
azul?
No dia do lançamento
de “Quem Vai Ficar Com Morrissey?”, eu e as cervejas geladas competíamos para
ver quem suava mais. As Heinekens me foram dadas em quantidade, na intenção de
amenizar o nervosismo responsável pela sudorese. Mas elas pouco conseguiam além
de me refrescar e embriagar, eram ineficazes contra a força opressora das
minhas dedicatórias, que se multiplicavam como nunca e, mesmo por isso, o
faziam de forma lenta, custosa. A fila de gente à espera dos meus garranchos se
avolumava e também não ajudava. No começo, busquei escrever coisas
personalizadas – até para as pessoas que não conhecia –, mas, vencido pela
impaciência dos que esperavam e pelo bem da minha sanidade, optei por um
padrão, com sutis alterações. Isso sem contar algumas das pessoas mais próximas
– família e amigos – que, ao invés do autógrafo, ganharam de mim a promessa de
que, depois, em outra ocasião, eu capricharia no que lhes escreveria. Se essa estratégia
me deu certo tempo, também me fez ganhar a antipatia de alguns, de quem vieram
críticas cochichadas e fofocadas – além de escritor, naquele dia fui promovido
também a esnobe.
Um desses amigos
relegados “a segundo plano”, justamente um dos melhores, só recebeu sua
dedicatória outro dia. O que lhe escrevi foi singelo, mas não foi por opção
tática. Foi o que saiu, e saiu até rápido, bonitinho. Mas nem tudo no mundo das
dedicatórias sem floreios é florido (desculpe, não resisti). Também
recentemente, escrevi algumas palavras a outro grande amigo, que me deu vários
toques durante o processo de escrita. A ele agradeci pelo “inSentivo”. Depois,
olhando envergonhado aquela aberração ortográfica, usei o barulho do bar como
desculpa pela minha desconcentração. Aquele “S” intruso era um sinal, as
dedicatórias me avisando: elas jamais me deixariam em paz.
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