quinta-feira, 15 de maio de 2008

Apenas diga não



Lanchonete Bob’s da Paulista, anos atrás:

- Por apenas mais 2,50, o senhor pode ter a porção extra de presunto, queijo e ovo. Aceita, senhor? – perguntou-me o atendente, sorridente mas sem muita esperança, seguindo o roteiro do seu treinamento.
- Obrigado... – respondi, imaginando o colesterol e a caloria adicionais, plenamente dispensáveis num sanduíche já repleto delas.
- Mas fica uma delícia, senhor... – insistiu, ainda sem botar fé.
- Ah, nesse caso, pode colocar – aceitei, possivelmente fazendo a foto do persuasivo rapaz estampar o quadrinho de “funcionário do mês”. Devo ter sido o primeiro, e talvez único, cliente a aceitar aquela promoção, um verdadeiro atentado contra a saúde pública.

Na hora não percebi, mas um discreto “yes” deve ter saído do lábios do rapaz, ao mesmo tempo em que desferiu o clássico soquinho no ar. Deve ter se sentido o máximo. Coitado. Não sabia que, para me convencer, não é preciso muito. Muitas vezes, aliás, não é preciso nada. Eu, meus amigos, nasci sem o chip do “não”. Uma deficiência séria, gravíssima, mas que, invisível ao olho nu, infelizmente não me habilita a estacionar nas vagas reservadas.

O governo americano, anos atrás, lançou uma campanha de conscientização quanto às drogas cujo slogan era “just say no”. Esperavam que, com uma instrução tão elementar, qualquer imbecil pudesse se livrar dos narcóticos. Raciocínio coerente: “não” é uma palavra simples mesmo para o vocabulário e a dicção não muito favorecidos dos adolescentes. Qualquer um conseguia dizer. Qualquer um que não eu, claro. Se não tenho um triste (e, às vezes, bem alegre) histórico de vício é porque as ofertas foram poucas. Desavisados, os traficantes deixaram de fazer dinheiro fácil com o mané aqui.

A impossibilidade de dizer o pequeno monossílabo já me prejudicou muito. Quantas manhãs de ressaca e cara amassada no trabalho causadas pela incapacidade de refugar baladas-roubadas sugeridas por amigos mais empolgados. Quantas balas sabor abacaxi ou aniz (éca) compradas no farol. Quantos filmes alugados e devolvidos sem ser vistos por não conseguir recusar a proposta do balconista de levar três pagando apenas dois, mesmo que eu só quisesse ver um. Quanto dinheiro emprestado que nunca mais verei – só não é mais porque, para o azar de quem pediu e, principalmente, para o meu, não passo nem perto de ser rico.

Isso sem contar a azia que aquela porção extra de queijo, presunto e ovo do Bob’s me causou. A queimação, que até hoje sinto, ainda deve ser a mesma.

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