quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Perfect Day

Ele acordou, coincidentemente, ao mesmo tempo em que ela. Ainda como que sincronizados, olharam pela janela e, ao perceber o céu azul que todos os sábados deveriam ter, pensaram a mesma coisa. “Vamos levar as crianças ao zoológico?” disseram, em coro não ensaiado.

Filhos no carro, ela disse que não estava a fim de dirigir. Ele não se importava de guiar, mas, já que seria o motorista, fez questão de escolher a rádio. Ouviram a música em silêncio, embora fosse a preferida de ambos. A canção lhes trazia lembranças de outras pessoas, mas, por ser uma dessas melodias impossíveis de não gostar, os dois decidiram não mexer na sintonia. Daria muito na cara.

No zôo, passearam de mão dadas. As memórias das quais a música tirara a poeira, colocadas novamente na gaveta – pelo menos, assim se esforçaram parecer. Para disfarçar seu desconforto, ele se ofereceu para comprar pipoca, que ela aceitou alegremente, para disfarçar o próprio. Pipoca doce cor de rosa do jeito que ela sempre gostou. Ele dava na boca dela, e ela comia sem parar e sem perguntar se ele queria. Os risos que vieram em seguida serviram para pôr de fato as recordações no arquivo morto.

Viam os pequenos maravilhados com os elefantes, parecidos estátuas móveis, incólumes pousadas de pássaros. O sol radiante do sábado, cintilante, mas não muito forte, brilhava sobre os paquidermes realçando sua monstruosa beleza. O sol brilhava sobre eles também. Revelava o castanho dos olhos dele, muitas vezes tidos como pretos. Dava à pele morena dela tonalidades douradas. Ele pensava que nunca tinha sido tão feliz. Ela, para variar, pensava o mesmo. Uma felicidade que parecia impossível.

Foi então que se encontraram. Ele, com mulher e dois filhos pequenos; ela também casada, também com duas crianças. “Oi, tudo bem?” Cinco anos sem se ver, tanto para se falar e “oi, tudo bem?”. Não seria àquele dia que se falariam tudo o que queriam. Nem àquele dia, nem em nenhum outro.

- Quem era?
- Ninguém.

As mesmas perguntas, as mesmas respostas. A mesma certeza: a felicidade de fato era impossível.

(Inspirado em “Five Years Time”, Noah And The Whale)

2 comentários:

ju leal disse...

ai

Anônimo disse...

Muito bom leandrinho. Esses encontros e desencontros da vida... A felicidade batendo à porta na "hora errada". Quando será a hora certa? Talvez por isso pareça impossível...
Depois manda a música.
Grande abraço