terça-feira, 18 de setembro de 2007

O casal que não fala


Num bar. Num restaurante. Numa mesa ao lado da sua. Pode reparar: em meio às conversas e gargalhadas gerais, sempre há um casal que permanece calado. Não é aquele silêncio próprio da cumplicidade, facilmente identificado pelos olhares trocados, por si só verborrágicos. Esses dois estão quietos de outro jeito, constrangedor. Como eles, seus olhares nada têm a dizer e, por isso, evitam encontrar-se. Preferem a beleza imprecisa da bolacha de chope puída sobre a mesa ou o ineditismo do acústico do Capital Inicial na TV do estabelecimento.

Sempre que via uma dessas miseráveis duplas, me perguntava: por que ainda são um casal, se nada têm em comum? E, se insistem em permanecer juntos, por que expor sua condição lastimável ao público? Se é para não se divertir, poderiam ter ficado em casa – além do dinheiro, poupariam os outros clientes da triste visão. Mas descobri o que se passa com esses casais. Sim, eles se falam, e muito. Tanto é que, quando vão aos restaurantes e bares, já estão sem assunto.

Onde conversam? No cinema. No teatro. Nem precisa reparar: em meio ao silêncio que deve imperar nesses locais, você vai ouvir um casal de imbecis que não calam a boca, geralmente sentado bem perto de você. Você, nesse caso, sou eu mesmo, um imã para essas matracas. Só Deus e a minha namorada sabem quantas vezes me contive para não sair na mão no meio de um filme. Não poderiam esperar até o fim da sessão, até o jantar? Claro que não. Comentários do gênero “todo mundo nesse filme (‘300’) tomou bomba” são brilhantes demais para serem contidos por tanto tempo. A genialidade não tem hora, e cabe aos menos dotados não atrapalhá-la.

Além disso, durante o jantar depois do cinema, eles estarão muito ocupados admirando a velha bolacha de chope ou o acústico do Djavan. (O DVD do Capital deve ter sido quebrado por algum cliente revoltado.)

6 comentários:

Unknown disse...

Certeza que um dia ainda vou separar uma briga entre você e um matraca no cinema.
Adorei o texto ;-)

ju leal disse...

Le, achei que eu era a única ranheta! E isso pq eu falo, como vc, pra c#$&@*o! e como, não? mas pelo menos, na hora certa...
beijos

Cris disse...

Ninguém merece falatório durante todo o filme, eu também sou dona de ter essas pessoas por perto e penso, por que, será que é sina? (rs);

Leandro Leal disse...

Cris: Sim, infelizmente é.Bem-vinda ao clube. Lendo meus outros textos, você descobrirá que essa não é minha única sina. O lado bom é que tenho assunto para as crônicas. :)

Cris disse...

Pois é, Leandro, leio em seus textos que você tem olhos de ver, mas uns olhinhos assim digamos, bem "reais", será que essa seria a palavra correta, crianças feias, gente falando demais ou não se falando, mulheres da barriga peluda...talvez eu é que floreie demais ou veja poesia demais nas coisas..(rs)

Leandro Leal disse...

Cris: Tenho uns olhinhos meio irônicos, meio critícos... meio filhos-da-puta. Não sei dourar a pílula Mais uma de minhas maldições. Mas, como já disse, pelo menos elas me dão assunto para os textos.