domingo, 1 de janeiro de 2012

Como pretendo viver o último ano da minha vida

Li pouco o Daniel Piza. Esse pouco se manteve assim porque não foi o suficiente para me tornar admirador do seu trabalho. Noticiada ontem, a morte do jornalista me chocou como chocam todas as precoces e repentinas, de nomes minimamente conhecidos. Teria ficado nisso, apenas no “coitado... agora vamos ler o esporte”, se minha namorada e ele não fossem próximos. Não íntimos, próximos fisicamente mesmo: colegas de Estadão, a mesa da Débora fica em frente à sala que Piza ocupava.

Assim, naturalmente, tivemos a companhia do Daniel Piza ao longo do último dia do ano. Memórias das conversas durante os eventuais cafés que tomavam juntos, comentários lamentosos sobre uma planejada mudança da família – deixou esposa e três filhos – para Nova York que jamais aconteceria, e as inevitáveis considerações sobre o sentido da vida. Se soubesse que morreria tão cedo, será que ele teria vivido de outro jeito? E eu, como aproveitaria meus anos, se fosse avisado de que me restariam poucos?

Para responder às perguntas da Débora – e mesmo às minhas – tomei como ponto de partida o verso de uma música que, já há dias, não me saía da cabeça. Em “Beautiful Boy”, John Lennon define: “a vida é o que acontece enquanto fazemos outros planos.” Talvez a vida realmente tenha outros planos para nós, e, mesmo que entre eles esteja a morte, não podemos deixar de fazer os nossos próprios. Sem imaginar que os dele seriam interrompidos aos 41 anos – um a mais que Lennon –, Piza se preparava para essa nova etapa, nos Estados Unidos. Eu teria feito exatamente o mesmo.

O clichê “viver cada dia como se fosse o último” nos remete a imagens igualmente percorridas, de gente pulando de pára-quedas ou sentada no topo de uma montanha admirando o pôr do sol, perpetuadas por comerciais e filmes de baixa qualidade. Já minha tradução para a máxima é outra, bem menos empolgante. O último dia da minha vida pode ser passado na cama, lendo um livro, de ressaca ou apenas com preguiça demais para me levantar – até mesmo para abrir a janela e ver o pôr do sol.

O último dia da minha vida deve ser como qualquer outro, uma extensão dela, vivido de acordo com meus próprios princípios e convicções. Desapontando algumas pessoas, mas tentando não fazer isso comigo mesmo.

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